Em: Economia No dia: 13 de janeiro de 2021
A variação do IPCA em 2020 – a maior nos últimos quatro anos – não altera o cenário para a inflação deste ano traçado pelo economista Heron do Carmo, professor sênior da FEA/USP e especialista no tema. Ele admite que o resultado preocupa, mas não vê descontrole inflacionário, por enquanto. Heron mantém a expectativa de inflação em torno de 3% para 2021.
O economista argumenta que o resultado foi muito concentrado nos alimentos, especialmente os semi-elaborados, que incluem carnes, óleo de soja, por exemplo. “Se não tivesse ocorrido esse aumento para esse grupo, a inflação do ano ficaria pouco acima de 2%.” A seguir, os principais trechos da entrevista.
Como o sr. avalia o resultado da inflação de 2020?
Dezembro surpreendeu. Eu esperava um resultado inferior para o mês porque os preços dos alimentos já tinham subido muito até então. Também houve o aumento da energia elétrica. No ano, a inflação foi de 4,52% e o Boletim Focus, do Banco Central, apontava para 4,37%.
Esse resultado preocupa?
Preocupa, mas, por enquanto, não sinaliza um descontrole da inflação para este ano. Isso porque o aumento da inflação acima do centro da meta em 2020 (de 4%) tem uma causa definida. Está concentrado no comportamento dos preços dos alimentos. Só os semi-elaborados (carnes, cereais etc) subiram 25% no ano passado e responderam por 2,4 pontos da inflação de 4,5%. Mais da metade da inflação do ano pode ser atribuída a este grupo de alimentos, que corresponde a menos de 10% das despesas familiares. Carne, arroz e óleo de soja, por exemplo, responderam por um ponto da inflação de 2020. O que aconteceu em 2020 é muito explicado pelo comportamento do preço dos alimentos e das commodities alimentares. Não foi um movimento geral de alta de preços. Se não tivesse ocorrido esse aumento para esse grupo, a inflação do ano ficaria pouco acima de 2%. É claro que, quando se tem um resultado ruim, assusta e isso vai aparecer nas próximas previsões.
Esse resultado altera as projeções para 2021?
Apesar de os alimentos semi-elaborados terem subido muito em dezembro, o ritmo de alta foi menor do que o registrado em novembro. Isso indica que o choque tende a se esvair. O mais provável é que haja uma estabilização dos alimentos este ano. Isso retira algo como mais de dois pontos da inflação. A minha previsão é em torno de 3% para 2021, a menos que ocorra uma variação no câmbio. No ano passado, tivemos uma maxidesvalorização de 30%.
O que poderia levar a inflação ao descontrole neste ano?
Se houvesse um descontrole da política econômica, algo que comprometesse os fundamentos. Por exemplo, uma alteração radical no teto de gastos, alguma questão de ordem política interna que gere pressão sobre o câmbio.
Diante da inflação de 2020, o Banco Central deve subir os juros?
A taxa de juros está muito abaixo da inflação e isso tem uma série de implicações. Todos os títulos são atrelados à Selic (taxa básica de juros) e isso pode implicar perda de rentabilidade muito grande. Muito provavelmente o Banco Central deve começar a aumentar os juros. A alta dos juros vai contribuir marginalmente para reduzir a propagação do choque de preços e para fazer com que a taxa de juros real não fique tão negativa. Estamos com taxa de juros negativa de 2,5 pontos porcentuais, a grosso modo. E tudo indica que a inflação deve continuar subindo em 12 meses ainda nos próximos meses. Vamos chegar a um ponto em que a taxa de inflação em 12 meses poderá estar acima da meta, que é 5,25%. E o BC tem que dar uma resposta a isso. E a resposta é aumento de juros.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.