Max Dias
Historiador, jornalista, professor do IFES Campus Linhares e Doutor em História

Que 2020 não se repita


Publicado por: Max Dias Em: Política No dia: 30 de dezembro de 2020


Para muitos de nós 2020 foi um ano para ser esquecido. Já para o conhecimento histórico, esse será um ano relembrado e, por diversas vezes, revisitado, recontado, jamais abandonado. Se para o que pretende esquecer a lembrança o acompanha enquanto uma tormenta, para o historiador os fatos e memórias ajudam a compor o cenário do aprendizado para que o trauma não se repita, ainda que o atemorize.

Na verdade, as sensações de cada um acerca do tempo são extremamente diversas, apesar de haver um conhecimento bem qualificado desse intrigante tema no século XXI. Entre um ano que passou devagar e um outro que rapidamente se foi existem mais do que os meses, dias e horas que o compõem. Existe o ser humano construindo o mundo que o cerca.

Entretanto, o planeta Terra construído por muitos neste ano que se finda parece ter dado passos atrás. Se por um lado inauguramos 2021 com a sensação de que a ciência, mais uma vez, pode nos levar a um avanço capaz de salvar muitas vidas e restabelecer a dita “normalidade”, por outro cremos que a narrativa negacionista, que ovaciona o fabuloso em detrimento do científico, segue fazendo reféns. Isso demonstra uma crise do discurso científico – distante dos enredos miraculosos propalados nos templos e nos infinitos grupos de whatsapp – mais que uma ineficiência do seu tradicional método de trabalho.

Desde quando coloquei os pés pela primeira vez na Universidade Federal do Espírito Santo em 2002, saído jovem de Cachoeiro de Itapemirim, ouvi pelos diversos corredores daquele campus em Goiabeiras o quanto era necessário que o conhecimento acadêmico chegasse até as pessoas na mesma medida em que a sociedade adentrasse à UFES. Se a instituição reconhecia a sua histórica ineficiência para dar retorno, a quem era de direito, acerca das pesquisas construídas, hoje percebe-se que houve uma inserção de grupos excluídos – inclusive nos cursos outrora frequentados pelo mesmo tipo de gentes – potencializando novas formas de saber que extrapolou o espaço acadêmico.

Esse constante processo de democratização do conhecimento aumentou o conflito entre fazeres tradicionais e saberes contemporâneos. Enquanto o primeiro evoca a manutenção das coisas tais como elas são o segundo agiliza a ruptura com o mundo tal qual o conhecemos, colocando assim o status quo em risco. Parte das batalhas que se anunciam na década próxima tem esse confronto como pano de fundo, por mais que a guerra nesse instante pareça ser entre cloroquina e vac(h)ina.




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