Max Dias
Historiador, jornalista, professor do IFES Campus Linhares e Doutor em História

O óbvio é a democracia


Publicado por: Max Dias Em: Colunistas No dia: 12 de agosto de 2022


É tempo de defender o óbvio. Que lástima, completaria Bertolt Brecht se vivo fosse em 2022. Por mais que se tergiverse, a democracia brasileira vive em constante risco desde a ascensão de Jair Bolsonaro em 2018. Não foram poucos os que desembarcaram do náufrago atual, mesmo que ainda não tenham dito de modo claro o que os fez navegar com o capitão em 2018. Quem mudou de lá para cá? O que mudou desde então? A crença de que as coisas pioraram não se traduz apenas em números de pesquisa, elas estão nas esquinas das médias e grandes cidades brasileiras.

Brecht, exilado em razão da perseguição nazista, fez dos seus versos e dramaturgias um exercício de liberdade plena, diferente desse pseudo liberalismo econômico que segue em voga entre alguns setores que defendem o indefensável. De fato, os anos que antecederam a Segunda Guerra tornaram muitos artistas e pensadores inimigos da sociedade idílica fascista – aquela do eterno retorno nacional, de um suposto passado de glória que fora perdido em razão do progressismo e da permissividade liberal. Derrotados os fascistas, persiste até hoje a erva daninha que eles semearam. O alemão Bertolt Brecht foi apenas uma vítima dessa experiência traumática. As vítimas seguem em progressão geométrica mundo afora.

Os fatídicos anos de 1940 também foram retratados em versos por Carlos Drummond de Andrade. Era um tempo partido assim como as gentes que aqui viviam. Um Brasil de Getúlio Vargas, de personificação da política em ditadura, de censura, tempo de “meio silêncio”, “palavra indireta”. Se vivo fosse, Drummond seria mais um, dentre tantos artistas, em torno da carta pela democracia. Atualíssimo, “Nosso tempo” seguiria (como segue) irretocável, e com um pouco mais de esforço seria recitado em reels por toda a web.

Esse clamor democrático vem com muito atraso, mas tomara que a tempo. Vê-lo desse porte passa-nos a segurança de que grande parcela da população brasileira entendeu o saldo final das rupturas e ditaduras. Cheias de sangue nas mãos, as Forças Armadas têm uma oportunidade única de rejeitar toda ascensão autoritária que Jair Bolsonaro tem impingido ao Brasil às vésperas da eleição. A janela para um ajuste de contas com a história está escancarada, enquanto “símbolos obscuros se multiplicam”. Se a Carta lida nesse dia onze de agosto serve como uma escalada para a estabilidade constitucional, a postura firme dos militares em defesa das instituições democráticas representaria uma definitiva chegada ao topo. E se é tempo de dizer o óbvio, que os generais também o digam.




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