Max Dias
Historiador, jornalista, professor do IFES Campus Linhares e Doutor em História
Publicado por: Max Dias Em: Colunistas No dia: 22 de setembro de 2020
Foi por falar demais que Jair Bolsonaro chegou à cadeira presidencial. A alcunha de “mito” reside no entendimento dos seus eleitores de que ele fala o que ninguém tem coragem de dizer. São coisas do tipo: “eu não vou discutir promiscuidade com quem quer que seja. Eu não corro esse risco e meus filhos foram muito bem educados”; “eu falei que não ia estuprar você porque você não merece”.
Se vivo fosse o filósofo Sócrates constataria, com cinco minutos de conversa, a incapacidade do presidente em cultivar incertezas. Tendo “aquela velha opinião formada sobre tudo”, Jair Bolsonaro demonstra o quanto o silêncio acerca dos 89 mil depositados por Fabrício Queiroz é um aliado de ocasião. Desde que tal evento veio à tona, o presidente deixou de dizer bravatas na porta do Alvorada e privilegiou viajar pelo país inaugurando obras que não são suas, falando de amenidades e deixando os ataques ao STF e Congresso Nacional de lado.
De fato, quando a coragem para dizer “a verdade” dá lugar ao silêncio que encobre a mentira o Jair Messias Bolsonaro se revela. Lembra a característica mudez do combatente que sobreviveu à guerra, porém, no seu caso, sem o trauma. Pressupõe, como na Alemanha pós-Hitler, que o esquecimento do passado é a melhor maneira para se construir o futuro nacional.
Ao se negar a dizer sobre o Queiroz, o presidente mantém sob proteção os setores empresariais, religiosos, judiciais e os aparelhos de segurança pública que lhe garantiram a eleição empunhando uma tal bandeira anticorrupção – os mesmos que vão seguir fazendo troça com o eleitor brasileiro no dia 15 de novembro.
Portanto, se há sabedoria no silêncio existe também o acobertamento nele. Devemos agradecer à natureza que nos deu duas orelhas e uma só boca para nos advertir o quanto ouvir é mais importante que falar, conforme Zenão de Cítio. Mas também devemos rechaçar completamente o silêncio obsequioso que serve apenas para manter intacto o segredo dos que fingem inocência.