Max Dias
Historiador, jornalista, professor do IFES Campus Linhares e Doutor em História

Devagar com o andor que a santa é de barro


Publicado por: Max Dias Em: Colunistas No dia: 6 de maio de 2022


Toda vez que os ministros do STF ou o presidente do Congresso Nacional chegam nos jornais e repetem que a democracia brasileira segue em pleno funcionamento é porque, de fato, eles já não conseguem esconder o furacão que arrasta a nossa República. “Quando Barroso me fala de democracia, sei mais de barro(so) que de democracia”. É nesse imbróglio freudiano que estamos metidos.

O caso do deputado bolsonarista Daniel Silveira demonstra bem essa conjuntura citada. Perceba: o fato de Silveira se negar a usar tornozeleira eletrônica é um indicativo de que a voz do poder judicial já não está sendo obedecida. Isso porque, segundo o próprio deputado, ele estaria amparado pela decisão presidencial. O executivo sobrepondo-se ao legislativo no governo Bolsonaro é prática comum desde o instante em que o centrão tomou de assalto o cofre do Planalto. Mas o judiciário ser desafiado desse modo é algo, sem dúvida, novo. E nesse instante é preciso cautela.

Inebriado pela tese de que as instituições republicanas estão funcionando, o STF não mediu bem os impactos de sua decisão no caso Daniel Silveira e tornou o episódio um cavalo de batalha, onde o cabo de guerra pende para o lado do presidente. Fisgados, os ministros da Suprema Corte brasileira ficaram atônitos com tamanha pernada política que levaram de Bolsonaro e agora recolhem os restos de sua desmedida atitude. É irônico notar que o crime cometido por Daniel Silveira e o absurdo perdão concedido por Bolsonaro se tornaram armas contra Alexandre de Moraes e sua trupe que, agora, não sabem bem o que fazer para não melindrar ainda mais a democracia.

Pela lógica, o contra-ataque dos ministros viria com celeridade, mas você só percebe o tamanho da queda quando vai limpar os machucados. Nesse momento resta ao STF (na defensiva) tentar encontrar meios de proteger as eleições e suas urnas eletrônicas porque, até que a democracia se rompa (ou seus protetores se levantem), Bolsonaro não a deixará em paz por um dia sequer. Há, sim, medo no ar e ninguém, absolutamente ninguém, de força política e militar suficiente, tende a sair em defesa dos guardiães da Constituição.

Caminhando apressadamente com o andor, os ministros do STF correm o risco de quebrar a frágil Carta Magna de 1988 e acabar por atender aos interesses dos que pretendem destruí-la. Nessa procissão brasileira cada democrata espera que, ao final da cansativa romaria, reste ao menos a santa para a gente agradecer por todo o flagelo desses últimos anos.




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