Em: Política No dia: 4 de janeiro de 2021
Pressionado a dar respostas na economia e a iniciar de uma vez a vacinação contra a covid-19 no País, o presidente Jair Bolsonaro começa o segundo tempo de seu mandato com a expectativa de tirar do papel uma reforma ministerial. Especulada há meses, a mudança é aguardada por aliados que passaram a integrar a base do governo no Congresso e cobram espaço no Executivo. Segundo auxiliares, os próximos dois anos são fundamentais para Bolsonaro pavimentar seu caminho à reeleição em 2022.
Para isso, na avaliação de pessoas próximas, terá que priorizar o cumprimento de pelo menos parte das promessas da campanha de 2018 tanto em relação à área econômica quanto na pauta de costumes. E, sem uma boa interlocução com o Legislativo, isso não será possível.
Bolsonaro já fez 15 mudanças no seu primeiro escalão nos primeiros dois anos de governo, a maioria delas após crises internas. A próxima alteração já está programada. Com a saída de Jorge Oliveira da Secretaria-Geral da Presidência para assumir uma cadeira no Tribunal de Contas da União (TCU) no último dia 31, o presidente escalou o ex-chefe de gabinete, Pedro Souza, como interino. O substituto definitivo, contudo, só deve ser anunciado em fevereiro, após as eleições no Congresso.
Até agora, as trocas nos ministérios seguiram a escolha pessoal do presidente, o que frustrou o apetite de partidos por comando de pastas, embora siglas como Progressistas, Republicanos, PSD e PL tenham emplacado indicações em secretarias e autarquias importantes. A última delas ocorreu no início de dezembro, quando Bolsonaro demitiu o então ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, e nomeou em seu lugar Gilson Machado, que ocupava a presidência da Embratur e é amigo do presidente.
Eleito com o discurso da antipolítica e crítico do “toma lá, dá cá” – a troca de cargos no Executivo por apoio no Congresso – o presidente tem se defendido das críticas pela aproximação com o Centrão. “Esse negócio de ficar aí cada vez mais satanizando partidos não existe”, disse, em dezembro. Ele próprio já foi filiado ao Progressistas, PTB, PFL (atual DEM) e PSC, que fazem ou já fizeram parte do bloco que se notabilizou pelo fisiologismo em diferentes governos.
Prazos
A reorganização do primeiro escalão também tem como pano de fundo as movimentações de Bolsonaro para sua campanha à reeleição em 2022. Sem conseguir viabilizar o Aliança pelo Brasil, ele pretende definir, até abril, a legenda pela qual disputará pela segunda vez a Presidência. Embora tenha conversado com partidos maiores, como o Progressistas, interlocutores do presidente afirmam que ele deve optar por uma sigla menor para poder ter o controle do caixa e das decisões. Patriotas e PTB, do ex-deputado Roberto Jefferson, estão com as portas abertas ao clã presidencial – a expectativa é de que a adesão inclua os filhos do presidente.
Integrantes do Executivo apontam que as mudanças na equipe devem afetar, principalmente, a articulação política do governo. Neste caso, o ministro Luiz Eduardo Ramos deixaria a Secretaria de Governo para abrir espaço a um nome do Congresso. Entre os cotados para a função estão o atual presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e os líderes do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), e no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO). Ramos poderia, então, assumir a Secretaria-Geral.
Outra mudança aguardada é a saída de Onyx Lorenzoni (DEM-RS) do Ministério da Cidadania. Em conversas reservadas, o ministro disse que teve a garantia do presidente de que está seguro no cargo. Entretanto, a avaliação no Executivo é que Onyx teve desempenho abaixo da expectativa. A troca dele, na avaliação de um ministro, ajudaria a recompor a base e a definir o redesenho do Bolsa Família para suprir o fim do auxílio emergencial pago até dezembro por causa da pandemia da covid-19.
Vacina
Bolsonaro também inicia o segundo tempo de seu mandato sem data para iniciar a vacinação contra o novo coronavírus. Enquanto mais de 40 países do mundo já começaram a imunizar suas populações, o presidente tem tentado transferir a responsabilidade pela demora no Brasil às empresas que fabricam vacinas e diz “não dar bola” para a pressão.
Na avaliação de auxiliares diretos do presidente, Bolsonaro terá como desafio neste ano tentar convencer a população de que não é insensível às mortes causadas pela covid-19 e, ao mesmo tempo, evitar o agravamento de uma crise econômica causada pelo prolongamento da pandemia. Na análise de um ministro, que falou ao Estadão em caráter reservado, o governo terá que tratar a redução do custo Brasil como uma obsessão para conseguir atrair investimentos e favorecer o crescimento econômico. Segundo ele, a aprovação das reformas tributária e administrativa são consideradas essenciais, a exemplo da venda dos Correios à iniciativa privada, promessa de campanha de Bolsonaro. O entendimento interno é que o governo precisa entregar alguma privatização para dar uma sinalização positiva ao mercado.
Ao mesmo tempo, lembram auxiliares, a articulação política do Planalto precisará emplacar pautas de costumes cobradas pela militância bolsonarista mais radical, como o homeschooling (educação domiciliar) e a flexibilização do porte de armas.
Voto impresso vira prioridade
Na sua estratégia, o presidente Bolsonaro ainda colocou como prioridade para o próximo ano a defesa do voto impresso. Desde a derrota do republicano Donald Trump nos Estados Unidos, ele voltou a fazer a defesa quase diária da medida que prevê o uso de papel nas eleições. “Se não tiver voto impresso, posso esquecer a eleição de 22”, afirmou o presidente a apoiadores no litoral de Santa Catarina, em 23 de dezembro. Em março, completará um ano desde que afirmou pela primeira vez que a disputa de 2018 foi fraudada e que, sem a fraude, ele teria sido eleito no primeiro turno. Na ocasião, Bolsonaro disse que apresentaria provas nos dias seguintes, o que nunca fez.
A “arma” para isso é a PEC da deputada Bia Kicis (PSL-DF) que prevê a mudança nas urnas eletrônicas. Aprovada pela CCJ da Câmara no fim do ano passado, ela precisa passar por duas votações no plenário da Câmara e no do Senado. Pelo texto, os votos impressos poderão ser conferidos pelo eleitor e deverão ser depositados em urnas de forma automática, sem contato manual. A ideia é que os comprovantes sirvam para eventuais auditorias.
Em 2018, o voto impresso foi barrado pelo Supremo Tribunal Federal, que considerou a regra inconstitucional – por colocar em risco o sigilo da votação. A decisão foi confirmada em setembro e uma das razões foram os altos custos que a impressão dos votos acarretaria.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.