Em: Política No dia: 8 de janeiro de 2021
Uma portaria assinada nesta sexta-feira, 8, pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, facilita o compartilhamento interno de informações no âmbito do Ministério Público Federal (MPF), inclusive os dados sigilosos levantados pelas forças-tarefa da Operação Lava Jato. Esta é a primeira vez que a Procuradoria-Geral da República (PGR) regulamenta o recebimento, armazenamento e compartilhamento de dados obtidos por procuradores, tema que se tornou alvo de discórdia entre a cúpula da instituição e procuradores de Curitiba.
De acordo com a PGR, a portaria “deve simplificar o trabalho dos membros do MPF, possibilitando uma atuação mais célere e efetiva nas investigações, e otimizar a gestão do conhecimento dos dados recebidos pela instituição”. A Procuradoria observa que dados recebidos pelo MPF por meio de decisão judicial somente poderão ser compartilhados com aval da Justiça, exceto no caso de informações ou provas já tornadas públicas mediante decisões da Justiça.
O texto, no entanto, provocou apreensões entre integrantes do MPF ouvidos pela reportagem. Um dos riscos levantados é o que a medida poderia gerar incidentes em casos mais sensíveis, como ações penais.
Desde que assumiu o comando da PGR, Aras tenta impor uma “correção de rumos” aos trabalhos das forças-tarefa da Lava Jato, criticando métodos “personalistas” de procuradores e a existência de “caixas-pretas”, em relação ao volume de informações obtidos nas apurações. No mês passado, durante café com jornalistas, o procurador disse que o banco de dados da Lava Jato de Curitiba seria colocado à disposição a integrantes do MPF.
“Os mil terabytes de Curitiba já se encontram aqui custodiados no órgão master, guardado à disposição da Corregedoria. Nós estamos trabalhando com a ideia de promover esse compartilhamento de dados e seguindo modelo do Coaf”, disse Aras, na ocasião.
A portaria prevê um prazo de 90 dias para a implantação do sistema. Também estabelece que a Corregedoria do MPF poderá, a qualquer tempo, “realizar auditoria sobre os registros de acesso aos dados recebidos pelo Ministério Público Federal no exercício de suas funções institucionais”
De acordo com a portaria, todos os dados recebidos pelos membros do Ministério Público Federal deverão ser registrados no sistema interno Único e classificados de acordo com o grau de sigilo. O armazenamento das informações será feito diretamente no sistema ou ‘em solução disponibilizada pela própria instituição’.
Já o compartilhamento poderá ser feito ou por iniciativa do procurador responsável pelo caso ou a partir de solicitação formal de qualquer membro do MPF interessado nas informações, diz a PGR.
Com a diretriz, se um procurador do Amazonas quiser ter acesso a dados obtidos por um colega de Mato Grosso, será necessário formular o pedido pelo sistema interno Único, expondo os motivos do interesse em obter as informações. O procurador “dono” da informação vai analisar se autoriza ou não o compartilhamento. Se recusar o compartilhamento, precisa informar imediatamente a Corregedoria e justificar a recusa. Em caso de controvérsia, cabe à própria Corregedoria dar a palavra final sobre o envio das informações.
A PGR frisou ainda que dados recebidos pelo MPF por meio de decisão judicial somente poderão ser compartilhados junto com respectiva autorização judicial para tanto, exceto em casos em que houve levantamento de sigilo dos autos.
Procurada, a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba não se manifestou.
Histórico
Em agosto do ano passado, o relator da Operação Lava Jato no STF, Edson Fachin, derrubou uma decisão de Dias Toffoli que havia determinado o compartilhamento de dados das forças-tarefa da Lava Jato com a cúpula da PGR.
Em julho de 2020, durante o plantão do STF, Toffoli determinou às forças-tarefa da Lava Jato – em Curitiba, São Paulo e no Rio de Janeiro – que enviassem à PGR “todas as bases da dados estruturados e não-estruturados utilizadas e obtidas em suas investigações”. Com o retorno das atividades do tribunal, Fachin – relator da ação – analisou o caso e derrubou o entendimento de Toffoli, expondo as divisões internas do Supremo sobre os métodos de investigação da Lava Jato.
Técnicos da PGR já haviam coletado dados de Curitiba, mas ainda não haviam ido ao Rio e a São Paulo atrás de informações das investigações.