Max Dias
Historiador, jornalista, professor do IFES Campus Linhares e Doutor em História
Publicado por: Max Dias Em: Colunistas No dia: 26 de agosto de 2021
A democracia brasileira está militarizada. A presença de generais, capitães, comandantes e brigadeiros no governo de Jair Bolsonaro é só a ponta da baioneta. O perigo maior está na base bolsonarista. Fortemente armada, sob o discurso da proteção familiar e patrimonial, os civis iniciaram uma corrida pelo “direito ao tiro”. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), a cada 100 brasileiros um tem arma. E os números só crescem. São mais de 2 milhões de armas em terras brasileiras, contando aqui os armamentos das polícias, do exército, marinha e aeronáutica. O histórico drama da violência nas grandes cidades não está mais só. Agora nos tornamos reféns, também, dessa militarização política, onde as Forças Estaduais de Segurança parecem querer alcançar protagonismo na defesa dos seus interesses de farda e dos rompantes presidenciais. O sinal de alerta já soou para os governadores e as candidaturas militares reforçam essa sinalização.
Se o crescimento das candidaturas militares é um sintoma que apresenta o estado febril da nossa República é importante destacar que esse não é um fenômeno novo. Nas eleições presidenciais de 1910 o marechal Hermes da Fonseca disputava com o jurista Rui Barbosa a quinta eleição direta da nossa história republicana. Num pleito amplamente fraudado (dos dois lados, como era de costume), o militar saiu vitorioso. Entretanto, Barbosa fez uma campanha de rua, centrado nas classes médias urbanas, e denunciou o perigo que rondava o país naquele momento: o retorno da república da espada. Para o candidato derrotado, o marechal Hermes da Fonseca representava tudo o que havia de mais antiquado na política, com o uso da força ao invés da diplomacia. Hermes era sobrinho de Deodoro da Fonseca, o personagem do exército que teve papel destacado na derrubada de Dom Pedro II.
A imprensa da época anunciava que um clima de polarização tomava conta da disputa e a partidarização das Forças Armadas era nítida. Rui Barbosa aproveitou o ensejo para fortalecer uma campanha civilista, dizendo que uma crise política não era motivo para “passarmos da medicação normal à medicação heroica”. Barbosa então aproveitou a corrida presidencial para defender reformas que iam do Código Civil, passava pelo concurso para ingresso no serviço público e chegava no voto secreto: todas pautas que seriam muito caras às oligarquias políticas do país, mas que, em dado momento, ganhariam força entre os segmentos urbanos. Foi no esteio da crescente crise republicana que ocorreu uma ampliação da insubordinação militar, na medida em que o exército passou a contestar a vitória de Artur Bernardes para presidente em 1922.