Max Dias
Historiador, jornalista, professor do IFES Campus Linhares e Doutor em História

Artigo Max Dias: Jair Bolsonaro um dia foi Daniel Silveira

Um dia Jair Messias Bolsonaro foi Daniel Silveira e a Câmara já esteve diante de fazer o que era certo, definindo pela perda de mandato e a cassação dos seus direitos políticos.

Publicado por: Max Dias Em: Política No dia: 24 de fevereiro de 2021


A Câmara Federal, ao manter a prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), deu uma resposta à opinião pública. Mas tal resposta ainda não é definitiva e isso é o que mais preocupa. Ninguém tem dúvidas que os critérios utilizados pelo Conselho de Ética da Câmara devem garantir a ampla defesa do deputado a fim de que a isonomia possa prevalecer sobre o excesso. Entretanto, o que a sociedade não merece assistir é o eterno corporativismo dos membros daquela Casa de Leis, permitindo com que falas criminosas sigam proliferando em sua Tribuna pondo em risco a própria democracia.

Um dia Jair Messias Bolsonaro foi Daniel Silveira e a Câmara já esteve diante de fazer o que era certo, definindo pela perda de mandato e a cassação dos seus direitos políticos. Na época Bolsonaro estava no PPB e a acusação que recaia sobre ele era por defender, em dois discursos, o fuzilamento de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), então presidente do Brasil. Fazendo uso de uma suposta liberdade de expressão – ausente no regime ditatorial que o deputado seguia em defesa – e protegido pela imunidade parlamentar, Bolsonaro destilava todo o seu extremismo sem qualquer cerimônia. “Está na hora do basta”, disse o líder do governo FHC, deputado Arthur Virgílio (foi ele quem entrou com o pedido de cassação do Bolsonaro alegando quebra de decoro). Ainda não estava, infelizmente.

Na verdade, desde o início de sua atividade parlamentar o atual presidente colecionava mais falas absurdas que projetos republicanos. Seu mandato era tão inerte que a sua defesa de fechamento do próprio Parlamento conserva até um grau de coerência. Segundo a revista Veja (12/01/2000), Bolsonaro era “um velho reincidente nesses capítulos” e os colegas toleravam “sem reação as suas insanidades”. Apesar dessa grita ocasional, na época até mesmo o PT, que tinha o ex-guerrilheiro José Genoíno enquanto líder na Câmara, defendeu apenas a suspensão do mandato de Bolsonaro. “São declarações inaceitáveis, mas não é o caso para perda de mandato”, disse ele para a Folha de São Paulo (06/01/2000).

É óbvio que naquela hora a Câmara não fez o que deveria ser feito. Na verdade, nem mesmo as Forças Armadas o fizeram, já que desde a década de 1980 o então capitão do exército colecionava insubordinações, apesar das absolvições no Superior Tribunal Militar. Talvez esperassem nele a redenção para que as facções em armas no país pudessem voltar a prevalecer como na ditadura. Vai saber. Como ilustração, Daniel Silveira também acumulou falas extremistas no Parlamento e, antes, problemas junto à Polícia Militar do RJ. Mesmo assim só deixou a corporação após ser eleito. Ou seja, caiu para cima.

Por fim, de acordo com a Veja (12/01/2000), com todo esse histórico “era de se esperar que a carreira de Bolsonaro andasse para trás”. Porém, ocorreu diferente. Bolsonaro se tornou “prestigiado entre alguns setores das Forças Armadas” obtendo muitos votos “no baixo clero militar”. Está aí a história para não nos deixar mentir. Segue aí o Daniel Silveira (e que a história não se repita).